Pierdo la razón si hablo, pierdo los años si callo.
31.3.18
24.3.18
23.3.18
Concordância de género
Por detrás de cada grande homem,
ouvira dizer,
estava sempre uma grande mulher. Por detrás
de cada grande mulher, seria provável,
haveria sempre um grande homem.
Olhava em volta e não via nenhum,
nem antes nem após.
Ninguém para a empurrar, ninguém
atrás de quem se pudesse esconder.
Era apenas ela,
tão crua quanto a roupa que tinha despido.
Baça, suja e sem
valer o trabalho de a apanhar do chão.
(Ou talvez,
e esse seria o seu problema,
não houvesse nela nada de grande.
Nem as mãos, nem as mamas,
nem a boca, nem a cona,
nem o tempo, nem a escrita.
A mediocridade, sabia-se,
tem-se sempre a si mesma
como termo de comparação.)
/Madalena de Castro Campos, aqui/
ouvira dizer,
estava sempre uma grande mulher. Por detrás
de cada grande mulher, seria provável,
haveria sempre um grande homem.
Olhava em volta e não via nenhum,
nem antes nem após.
Ninguém para a empurrar, ninguém
atrás de quem se pudesse esconder.
Era apenas ela,
tão crua quanto a roupa que tinha despido.
Baça, suja e sem
valer o trabalho de a apanhar do chão.
(Ou talvez,
e esse seria o seu problema,
não houvesse nela nada de grande.
Nem as mãos, nem as mamas,
nem a boca, nem a cona,
nem o tempo, nem a escrita.
A mediocridade, sabia-se,
tem-se sempre a si mesma
como termo de comparação.)
/Madalena de Castro Campos, aqui/
22.3.18
21.3.18
Uma faca só lâmina
Uma faca só lâmina
Assim como uma bala
enterrada no corpo,
fazendo mais espesso
um dos lados do morto;
assim como uma bala
do chumbo mais pesado,
no músculo de um homem
pesando-o mais de um lado;
qual bala que tivesse
um vivo mecanismo,
bala que possuísse
um coração ativo
igual ao de um relógio
submerso em algum corpo,
ao de um relógio vivo
e também revoltoso,
relógio que tivesse
o gume de uma faca
e toda a impiedade
de lâmina azulada;
assim como uma faca
que sem bolso ou bainha
se transformasse em parte
de vossa anatomia;
qual uma faca íntima
ou faca de uso interno,
habitando num corpo
como o próprio esqueleto
de um homem que o tivesse,
e sempre, doloroso
de homem que se ferisse
contra seus próprios ossos.
Seja bala, relógio,
ou a lâmina colérica,
é contudo uma ausência
o que esse homem leva.
Mas o que não está
nele está como bala:
tem o ferro do chumbo,
mesma fibra compacta.
Isso que não está
nele é como um relógio
pulsando em sua gaiola,
sem fadiga, sem ócios.
Isso que não está
nele está como a ciosa
presença de uma faca,
de qualquer faca nova.
Por isso é que o melhor
dos símbolos usados
é a lâmina cruel
(melhor se de Pasmado):
porque nenhum indica
essa ausência tão ávida
como a imagem da faca
que só tivesse lâmina,
nenhum melhor indica
aquela ausência sôfrega
que a imagem de uma faca
reduzido à sua boca;
que a imagem de uma faca
entregue inteiramente
à fome pelas coisas
que nas facas se sente.
/João Cabral de Melo Neto/
Assim como uma bala
enterrada no corpo,
fazendo mais espesso
um dos lados do morto;
assim como uma bala
do chumbo mais pesado,
no músculo de um homem
pesando-o mais de um lado;
qual bala que tivesse
um vivo mecanismo,
bala que possuísse
um coração ativo
igual ao de um relógio
submerso em algum corpo,
ao de um relógio vivo
e também revoltoso,
relógio que tivesse
o gume de uma faca
e toda a impiedade
de lâmina azulada;
assim como uma faca
que sem bolso ou bainha
se transformasse em parte
de vossa anatomia;
qual uma faca íntima
ou faca de uso interno,
habitando num corpo
como o próprio esqueleto
de um homem que o tivesse,
e sempre, doloroso
de homem que se ferisse
contra seus próprios ossos.
Seja bala, relógio,
ou a lâmina colérica,
é contudo uma ausência
o que esse homem leva.
Mas o que não está
nele está como bala:
tem o ferro do chumbo,
mesma fibra compacta.
Isso que não está
nele é como um relógio
pulsando em sua gaiola,
sem fadiga, sem ócios.
Isso que não está
nele está como a ciosa
presença de uma faca,
de qualquer faca nova.
Por isso é que o melhor
dos símbolos usados
é a lâmina cruel
(melhor se de Pasmado):
porque nenhum indica
essa ausência tão ávida
como a imagem da faca
que só tivesse lâmina,
nenhum melhor indica
aquela ausência sôfrega
que a imagem de uma faca
reduzido à sua boca;
que a imagem de uma faca
entregue inteiramente
à fome pelas coisas
que nas facas se sente.
/João Cabral de Melo Neto/
15.3.18
6.3.18
[Quando os dias são iguais e tristes]
Quando os dias são iguais e tristes
gosto de beber
para galgar a distância
que me separa do ser.
As veias levam o álcool
e o álcool embebeda-se no tanto que percorre.
Sabendo no corpo os caminhos todos
mistura-lhes o fora
dos quartos
das salas
da paisagem casa
da atmosfera inteira.
Fico tonta de universo,
e vibro e julgo
que os dias já não são iguais nem tristes.
Salette Tavares
/obrigada, Vício/
gosto de beber
para galgar a distância
que me separa do ser.
As veias levam o álcool
e o álcool embebeda-se no tanto que percorre.
Sabendo no corpo os caminhos todos
mistura-lhes o fora
dos quartos
das salas
da paisagem casa
da atmosfera inteira.
Fico tonta de universo,
e vibro e julgo
que os dias já não são iguais nem tristes.
Salette Tavares
/obrigada, Vício/
3.3.18
Biblioteca Pessoal - Eça de Queirós
"No ano final do século XIX, morreram em Paris dois homens de génio, Eça de Queirós e Oscar Wilde. Que eu saiba, nunca se conheceram, mas ter-se-iam entendido admiravelmente."
/Biblioteca Pessoal, Jorge Luis Borges/
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