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Andamos então sem reflectir, cumprindo, um atrás de outro, os actos que o hábito ordena, detendo-nos apenas para comer (há bocados de pão na mesa e no estrado da sala) ou ver-nos no espelho que duplica o quarto. À noite, caímos repentinamente na cama e a tendência para lavar os dentes antes de dormir cede perante a fadiga, consegue apenas substituir-se por um gesto dirigido ao candeeiro ou aos remédios. Lá fora ouvem-se andar e andar em circulo as mancúspias adultas.
Não nos sentimos bem. Um de nós é Aconitum, quer dizer que deve medicamentar-se com aconitum altamente diluído se, por exemplo, o medo lhe provoca vertigens. Aconitum é uma violenta tempestade que passa depressa. De que outra forma descrever o contra-ataque a uma ansiedade que nasce de qualquer insignificância, do nada. Uma mulher depara bruscamente com um cão e começa a sentir-se fortemente enojada. Então aconitum e daí a pouco só fica um enjoo suave, com tendência a andar para trás (aconteceu-nos isto, mas era um caso Bryonia, o mesmo que sentir que nos afundávamos com, ou através da cama).
O outro, ao contrário, é nitidamente Nux Vomica. Depois de levar a aveia malteada às mancúspias, talvez por se baixar demasiado ao encher a escudela, sente de repente como se o cérebro lhe girasse, não que gire tudo à volta - a vertigem em si -, mas a vista é que gira, a consciência gira dentro dele mesmo como um giroscópio no seu aro, e lá fora está tudo tremendamente imóvel, só que a fugir e inacessível.
(cont)
Julio Cortazar, in Bestiário