Só mais tarde, ao viver sozinho em Londres, quando já tinha vinte e tais anos, decidi ensinar-me a nadar. Na gelada piscina de East End, construída no período entre as duas guerras, descobri que a água era capaz de suportar o meu corpo. Compreendi o que tinha perdido até àquele momento: a minha própria flutuabilidade. Não era uma questão de exercício: era antes a ideia de perder o pé, de permitir que outra coisa fosse responsável pela minha presença física no mundo; ser parte dele e estar separado dele ao mesmo tempo. De certa forma, tratava-se de uma reinvenção consciente, de uma maneira de enfrentar os meus medos.
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As cidades e as civilizações erguem-se e caem, mas o mar é sempre o mar. «Não associamos a ideia de antiguidade ao oceano, nem nos perguntamos qual seria o seu aspecto há mil anos, como tantas vezes fazemos relativamente à terra, porque o oceano sempre foi igualmente selvagem e insondável», escreveu o filósofo Henry David Thoreau. «O oceano é um espaço selvagem que dá a volta ao globo, mais selvagem do que uma selva de Bengala, mais cheio de monstros, embatendo contra os molhes das nossas cidades e os jardins das nossas residências à beira-mar.»
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A partir do momento em que o vemos, não conseguimos esquecê-lo, tal como quem nunca o viu é incapaz de descrevê-lo.
in Prólogo, Leviatã. Em busca dos gigantes do mar, Philip Hoare