Foi a partir daí que comecei a achar que afinal, sendo agradável e enriquecedor, não era assim tão inofensivo pertencer ao mundo das amigas da minha mãe. Pouco a pouco fui-me desligando delas e no funeral de Aline verifiquei que já não conseguia passar para o seu lado, como se a morta tivesse erguido uma barreira definitiva entre nós. A minha mãe reparou e espantou-se com o que chamou a minha ingratidão monstruosa depois de ter recebido tantas provas de amizade durante vários anos, "Não sabes gostar de quem gosta de ti. Gostas e não gostas conforme te dá o vento. Culpas as pessoas e quem muda és tu. Nunca serás fiel a ninguém. Ao menos espero que saibas fingir diante do meu cadáver. "
Prometi-lhe, em tom de farsa, que não teria razão de queixa. Podia falar levianamente porque só a morte dela me importava e no íntimo alimentava a esperança de ter uma mãe imortal.
História da Bela Fria, Teresa Veiga
(contos, 1992)