Na minha estante, no outro extremo da sala, havia um telescópio portátil com uma capa de Cordura verde. Pedira-o emprestado ao meu pai para ir observar aves e não o tinha devolvido. Esquecera-me de o levar na última visita que lhe fiz. «Fica para a próxima», dissera ele, abanando a cabeça com uma exasperação bem-humorada. Não houve próxima vez. Não o pude restituir. Também não lhe pude pedir desculpa. Houve uma vez, talvez no dia a seguir à sua morte, ou no dia a seguir a esse, em que ia sentada num comboio com a minha mãe e o meu irmão. Íamos buscar o carro dele. Foi uma viagem desesperada. As minhas mãos agarravam com força o ferro áspero do assento até os nós dos dedos ficarem brancos. Recordo-me de buddleia, de escória ao lado da linha, de um gasómetro verde e da central nuclear de Battersea quando o comboio abrandou. E só quando já nos encontrávamos na estação de Queenstown Road, numa plataforma desconhecida sob uma cobertura de madeira branca, só quando já nos dirigíamos para a saída, me apercebi, pela primeira vez, de que nunca mais voltaria a ver o meu pai.
Nunca. Detive-me e fiquei imóvel. E gritei. Chamei-o em voz alta. Pai. E depois, a palavra Não saiu num uivo longo, decrescente. O meu irmão e a minha mãe abraçaram-me, e eu a eles. Um facto brutal. Nunca mais tornaria a falar com ele. Nunca mais voltaria a vê-lo.