2.12.15

o meu anão

Tenho vinte e seis polegadas de altura, sou perfeitamente consistido e, proporcionado, salvo no que respeita à cabeça, que é um pouco grande. Os meus cabelos são ruivos, em vez de negros como os da maior parte das pessoas, e além disso muitas espessos e crespos; uso-os repuxados para trás nas fontes e ao alto da testa, que se evidencia mais pela largura do que pela altura. O meu rosto é imberbe; afora isso, parece-se com o de todos os homens. As minhas sobrancelhas unem-se. Tenho uma força física considerável, sobretudo se me encolerizo. Quando me obrigaram a lutar com Josaphat, alcei-o sobre as minhas costas, ao fim de vinte minutos, e estrangulei-o. Desde então, sou o único anão da corte.

A maior parte dos anões são bobos. Têm por obrigação dizer gracinhas e executar facécias que provocam o riso dos seus senhores. Nunca me rebaixei a semelhantes manifestações. Ninguém mesmo mo chegou a propor. Só o meu aspecto proíbe que façam semelhante uso de mim! A minha fisionomia não se presta a chalaças ridículas. E não me rio nunca.

Não sou um bobo. Sou apenas um anão, nada mais.

Além disso, tenho uma língua mordaz, que pode agradar a certas pessoas do meu convívio. Não é a mesma coisa que ser o seu bobo.


O Anão  - Pär Lagerkvist - Antígona Editora