Há quem diga que, quanto voltamos a ler um livro, anos depois, não é o mesmo livro. É um fenómeno caro a Heraclito. A teoria diz que nós mudamos, aprendemos mais e quando relemos, fazemo-lo com outros olhos, mais experientes, mais sábios. Mas há a possibilidade, é só uma teoria, de, quando se fecha um livro numa prateleira, ele, febrilmente, trocar as suas próprias letras, tal como nós renovamos o sangue e vamos crescendo. Reescreve frases e parágrafos, acrescenta texto, elimina períodos, sublinha ideias. Ou como é que um objecto que pode conter tanta sabedoria, pode ter a vida de uma pedra, em vez da dum ancião de barbas? Ou como é que aquilo que contém inteligência pode não ser inteligente?
O Cavaleiro Ainda Persegue/ A Mesma Donzela, Afonso Cruz