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Se não sais de ti, não chegas a saber quem és - Adriana Lisboa*
O Times enviou certa vez uma pergunta a alguns autores de renome: «O que há de errado com o mundo de hoje?» Diz a lenda que a resposta de Chesterton** foi, «Prezados Senhores: eu.» Se a história é verdadeira ou não, ainda assim faz refletir. De acordo com a Oxfam, mais de metade da riqueza do mundo estará nas mãos de um por cento da população no próximo ano, conforme a desigualdade aumenta. O World Wildlife Fund nos informa que o atual desaparecimento de espécies é considerado de mil a dez mil vezes maior do que a taxa de extinção natural. O último relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas afirma que a influência humana no clima é clara, e as nossas emissões recentes de gases de efeito estufa são as maiores da história. O que há de errado, então, com o mundo de hoje?
Quando descobri a ficção de José Saramago, eu tinha dezoito anos. Folheava alguns títulos numa feira do livro no centro do Rio de Janeiro, e me deparei com um de seus romances. Tive a imediata impressão de que ele estava fazendo a mesma pergunta: O que há de errado com o mundo de hoje? E, como Chesterton, respondia: Eu. Nós.
É claro que não lemos livros de ficção em busca de tutela moral, e panfletagem não é o propósito da literatura. A poesia e a ficção são seu próprio fim. Para fazer coro com Fernando Pessoa, a literatura, como toda arte, é uma confissão de que a vida não basta.
*in Revista Blimunda, nº 35
**«La literatura es una de las formas de la felicidad; tal vez ningún escritor me ha dado tantas horas felices como Chesterton» (Jorge L. Borges)
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