3.7.16

Coração de Cão (iii)




– Não é de admirar! Veja-se o que aconteceu com os gatos. É um homem com coração de cão! 
– Oh não, oh não! – refutou Filipe Filipovitch numa voz arrastada – Meu caro doutor, está a cometer um enorme erro. Por amor de Deus, não difame o cão. Os gatos são um caso temporário… é uma questão de disciplina, bastam duas ou três semanas. Asseguro-lhe. Mais um mês e ele deixa de se atirar aos gatos. 
– Por que não já, então? 
– Ivan Arnaldovitch, isso é elementar, não percebo por que é que me pergunta. A hipófise não fica suspensa no ar, pois não? Foi implantada no cérebro do cão, e precisa de tempo para se adaptar. Agora Charikov está a mostrar o que resta do seu ser canino, e você tem de entender que os gatos são o menor dos males. Todo o horror está no facto de Charikov já não ter coração de cão, mas de homem! E um dos piores… Compreende? 
Muito excitado, Bormental cerrou as suas mãos magras e fortes, encolheu os ombros e anunciou, decidido: 
– Vou matá-lo de certeza.

[Coração de Cão, Mikhaíl Bulgákov]