7.1.16

«Não ranjo. Não sangro. Não choro. Não peço. Não morro.»

Detesto toda a psicologia.
Pelo menos tanto como o homem de trabalho
e os escritores movidos a bons sentimentos,
que o querem entreter ou melhorar ao módico
preço dos direitos de autor. Para me sustentar
tenho todas as loiras do mundo. E não são poucas.
De ambos os sexos e qualquer côr de cabelo.
É o que basta. A somar ao jogo. O jogo de
sonhar acordado. Sou o chulo vigil dos pesadelos
das mães. As nossas e as delas. A fera com
mais inteligência que moral. Uma inteligência manipuladora.
O abismo brilhante. Um falo que fosse vaso.
Disputo corridas sem sair do lugar e, por isso, sou
sempre o primeiro a alcançar a meta riscada no chão
com o giz líquido do meu sémen. Os outros chegam
estafados. Caem de borco. Matam a sede na fonte desse giz.
E pagam o pecado. A minha religião indulgencia-me sempre.
Sou o Papa Negro das Noites Brancas. O Papa Branco das Noites Negras.
Sou cinzento. Como as balanças que aferem o peso para aferir o custo.
Estou afinado. Não ranjo. Não sangro. Não choro. Não peço. Não morro.
A não ser que me sobrevenha uma embolia ao baralho. Ao caralho.
Por isso, conservo-me em álcool. Como os miúdos fazem às cobras. O formol é para os Deuses.

in Cirrose, Fenda